Intoxicação em cães devido a anti-depressivos SSRI
A incidência da intoxicação em cães por ingestão acidental de SSRI aumentou com o passar dos anos, segundo dados fornecidos pela Pet Poison
A serotonina é uma amina biogénica sintetizada maioritariamente no sistema nervoso central (SNC), nas células enterocromafins e em pequenas quantidades nas plaquetas. Possui um importante papel no mecanismo de agregação plaquetária, na manutenção do tónus vascular e na motilidade gastrointestinal.
Outras funções atribuídas a este neuro-transmissor estão relacionadas com a regulação do apetite, o estado de ânimo, a ansiedade e a felicidade. No SNC a serotonina é armazenada nas vesículas pré-sinápticas dos neurónios serotogénicos, na glândula pineal e nos neurónios catecolaminérgicos. Os SSRI inibem seletivamente o transportador de recaptação pré-sináptico da serotonina gerando um processo neuro-adaptativo dos recetores que resulta num aumento da produção de serotonina e na sua transmissão. Dado que não alteram a função de outros neuro-transmissores e apresentam não apresentam níveis elevados de toxicidade, possuem um perfil de segurança melhor do que o de outros fármacos psicotrópicos.
A incidência da intoxicação em cães por ingestão acidental de SSRI aumentou com o passar dos anos segundo dados fornecidos pela Pet Poison Helpline. Com o objetivo de definir os sinais clínicos, a dose tóxica e as consequências da intoxicação por SSRI em cães, foram revistos um total de 313 casos. Realizou-se um estudo retrospectivo entre fevereiro de 2005 e agosto de 2010 das chamadas recebidas pela Pet Poison Helpline. Incluíram-se os cães com ingestão presenciada ou suspeitada de SSRI (citalopram, escitalopram, paroxetina, fluoxetina, fluvoxamina, sertralina e outros).
Os sinais clínicos surgem de forma secundária à presença de elevados níveis de serotonina no sangue, as alterações mais frequentes na intoxicação por SSIR são de tipo neurológico (por depressão ou estimulação) e gastrointestinal. O tempo médio entre a ingestão excessiva de fármacos e a aparição de sintomatologia foi de 2 horas. Estatisticamente, não se deu nenhuma diferença significativa entre os sinais clínicos descritos na ingestão de um fármaco em concreto. Quatro dos cães incluídos neste estudo desenvolveram síndrome serotoninérgico com presença de tremores, alterações no estado de consciência, hiperreflexia, diaforese, diarreia, descoordenação e hipertermia. Em todos os casos, os cães apresentaram uma recuperação completa dos sintomas após serem tratados. As doses de medicação individuais ingeridas em cada caso foram de 11 mg/kg de citalopram, 916 e 866 mg/kg de fluoxetina e 258 mg/kg de paroxetina. A fluoxetina é o único fármaco com o qual se observou uma relação dose-dependente com o surgimento de sintomatologia.
Um total de 94 cães precisaram de assistência veterinária. Dos 55 casos nos que consta o tipo de assistência recebida, 37 foram hospitalizados e 18 foram atendidos na consulta veterinária. O tempo médio de hospitalização foi de 185h e a sobrevivência de 100%. O prognóstico em caso de intoxicação por SSRI é excelente sempre que esteja sob assistência veterinária.
Os SSRI são metabolizados no fígado e diminuem potencialmente a sua capacidade para metabolizar outros fármacos, alterando a concentração no plasma de outros componentes com elevado grau de união às proteínas plasmáticas. Muitos destes componentes geram metabólitos que se eliminam através da urina, e que se não forem metabolizados aumentam o tempo de vida médio do fármaco e, assim, o risco de interações. Por isso os cães com insuficiência renal ou hepática prévia são mais suscetíveis de apresentar sinais clínicos após a ingestão de SSRI. Se pretende aprofundar conhecimentos sobre o funcionamento do sistema gastrointestinal pomos-lhe à disposição o nosso guia.