FIV Gatos: Miopatia inflamatória associada ao vírus
A infeção pelo vírus da imunodeficiência felina (FIV) é uma doença importante que afeta um grande número de gatos, sobretudo os que vivem em liberdade. De facto, um estudo realizado por Arjona A. et al.1 e publicado em 2000, revelou uma prevalência de 8,3% em gatos infetados com FIV e 1,1% de gatos coinfetados tanto com FIV como com o vírus da leucemia felina. Apesar de ter sido descoberto em 1986, o vírus ainda continua a ser alvo de investigações sobre os seus efeitos na saúde e as doenças associadas, como as miopatias inflamatórias.
Os sintomas da imunodeficiência felina
O vírus da imunodeficiência felina danifica ou destrói as células do sistema imunitário, o que gera uma deterioração gradual da função imunológica. A fase precoce ou aguda pode decorrer sem sinais aparentes de doença, embora alguns gatos apresentem mal-estar, febre, diarreia aguda, alterações do trato respiratório superior e linfadenopatia.
Numa segunda fase, que pode durar apenas alguns meses ou prolongar-se durante anos, os gatos estão aparentemente saudáveis. Mais tarde, na fase de linfadenopatia generalizada persistente, o animal começará a apresentar sintomas leves, como febre recorrente de origem desconhecida, leucopenia, linfadenopatia, anemia, anorexia e perda de peso.
Nas últimas fases aumenta o risco de contrair doenças e infeções por outros vírus, bactérias e parasitas. Nesta altura, o animal costuma apresentar diarreia crónica, gengivite, infeções dermatológicas, alteração do tecido linfoide, anemia e leucopenia.
A miopatia inflamatória associada ao vírus da imunodeficiência felina
As miopatias inflamatórias são um grupo de doenças que envolvem a inflamação dos músculos ou tecidos associados, como os vasos sanguíneos que irrigam esses músculos. O processo inflamatório conduz à destruição do tecido muscular, e é geralmente acompanhado de debilidade. Em alguns casos, também é associado a dor e, com o passar do tempo, é provável que se produza uma perda de massa muscular ou atrofia.
Esta inflamação muscular pode ser causada por uma reação alérgica, pela exposição a uma substância tóxica, pela presença de doenças como o cancro ou pela ação de um vírus, que pode atuar como desencadeador da miosite autoimune.
Também as pessoas com VIH podem desenvolver miosite. Tien-Auh A. et al.2 concluíramque “muitas vezes a miopatia é a manifestação clínica inicial da infeção por VIH na sua fase assintomática”. As pessoas infetadas por VIH-1 com miopatia associada costumam apresentar debilidade progressiva subaguda dos músculos, mialgia e atrofia muscular.
Um estudo realizado por Podell M. et al.3 descobriu que esse mesmo quadro pode ocorrer nos gatos. Os investigadores analisaram 6 gatos de 8 meses infetados com o vírus da imunodeficiência felina. Comprovaram que, aos 18 meses da infeção, os valores da creatina quinase, uma enzima que se encontra no músculo esquelético e indica a presença de doenças musculares, eram significativamente superiores aos existentes antes da infeção.
Nesse estudo também utilizaram a eletromiografia, um exame muito sensível para detetar as miopatias associadas ao VIH em humanos, que tem um nível de eficácia de até 94%. Detetaram atividade espontânea anormal em 2 gatos.
Por outro lado, os exames histológicos revelaram que todos os animais mostravam pelo menos uma patologia muscular. Das 24 biópsias musculares, 63% apresentavam lesões histológicas. A histopatologia mostrou uma infiltração linfocítica perivascular e pericapilar, assim como necrose das miofibrilas, fagocitose e regeneração. De destacar que as extremidades posteriores estavam mais afetadas do que as anteriores.
Embora os investigadores não tenham observado evidências de debilidade muscular ou dor nos doentes analisados, concluíram que os exames mostram a existência de uma miopatia associada à imunodeficiência nos gatos adultos, que apresenta semelhanças com a polimiosite associada ao VIH-1 humano.
Um estudo mais recente realizado por Rolim V.M. et al.4 revelou a presença de miocardite em gatos afetados pelo vírus da imunodeficiência com idades compreendidas entre 1 e 4 anos. O exame microscópico e imunohistoquímico mostrou infiltração multifocal do miocárdio com linfócitos T e menos macrófagos, neutrófilos e células plasmáticas.
De facto, deve-se considerar que, embora o órgão-alvo principal das miopatias seja o músculo, outros órgãos internos também podem ser afetados, já que se trata de uma doença sistémica, e por isso os glóbulos brancos, que normalmente combatem as doenças, acabam por atacar as fibras musculares, os vasos sanguíneos e o tecido conjuntivo de órgãos, ossos e articulações.